Cultura e Lazer

Acervo doado revela resistência da umbanda durante a ditadura militar

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Um livreto verde de 1974, com estatutos do Centro Espírita São Jorge, no bairro de Cordovil, no Rio de Janeiro, integra um valioso acervo sobre cultura afro-brasileira doado este ano ao Arquivo Nacional pelo colecionador Fernandez Portugal Filho, jornalista, antropólogo e babalawô. Esses documentos, que estruturam o funcionamento de terreiros de umbanda, abrangem administração, fins religiosos e normas de conduta, oferecendo insights historiográficos sobre realidades locais e dinâmicas sociopolíticas. Fernandez destaca a importância política dos materiais, especialmente aqueles elaborados durante a ditadura militar, revelando como a umbanda se defendia e se fortalecia em um contexto repressivo, incluindo disputas internas e divisões patrimoniais. O acervo, iniciado quando Fernandez ingressou no candomblé e migrou para a umbanda, posicionou-o como referência em religiões de matriz africana, auxiliando na criação de estatutos para terreiros no Rio e recebendo visitas de líderes de outros estados.

Antes da doação ao Arquivo Nacional, Fernandez tentou sem sucesso repassar o material para instituições como a Biblioteca Nacional, o Museu da Imagem e do Som e o Instituto Moreira Salles, que não demonstraram interesse. O primeiro lote, doado em 1999, inclui revistas, recortes de jornais e materiais sobre arte negra, luta contra discriminação racial, saúde da população negra e feminismo, com destaque para itens relacionados ao senador Abdias do Nascimento, já disponíveis para consulta presencial. O segundo lote, de 2025, foca em documentos sobre religiosidade afro-brasileira, como estatutos, hinos e correspondências, e está em processamento pela Divisão de Processamento Técnico de Documentos Privados, com previsão de acesso público em 2026. Há expectativa de incorporação de materiais audiovisuais, como gravações em fitas cassete e VHS de terreiros no Brasil, Nigéria e Benin, ampliando as narrativas marginais na história oficial.

Mara Luci Araújo, da Coordenação de Documentos Escritos do Arquivo Nacional, enfatiza que a incorporação de acervos comunitários atende à missão de preservar a memória nacional, valorizando identidades como umbanda e candomblé. Túlio Saeta, técnico da divisão, explica o processo de identificação, codificação e digitalização para garantir a longevidade dos itens. Essa iniciativa reforça a importância de vozes historicamente silenciadas, contribuindo para novas leituras da história brasileira em contextos políticos e sociais.

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